Feel the blues
Vendo as imagens dos últimos dias perguntamo-nos, em primeiro lugar, em que zona de África é que isto fica. Vemos colunas de refugiados, gente espalhada pelo chão, aninhada junto às poucas malas e mobílias que se salvaram. Vemos pobres e ricos pendurados no mesmo viaduto. Pessoal a caminhar com água pelo pescoço, casas a boiar em ondas imundas e velozes, toda uma cidade a desaparecer. Vemos o comportamento humano em situações destas, o salve-se quem puder, o dá-me comida senão mordo-te, as pilhagens, a defesa selvagem de um pequeno reduto, a voracidade dos homens tranformados em lobos. Vemos a civilização a estatelar-se num charco. E foi assim, durou dois dias.
Não é ainda o tempo de escrever cartas abertas, como a de Michael Moore, assacando responsabilidades e instrumentalizando a catástrofe com fins políticos. Bush é pequeno demais para o que aconteceu. E pouco importa se estava no rancho, a jogar às cartas, ou se foi à festa de tal financiador ou acrobata. Pouco importa que o air force 1 sobrevoaasse a área após o desastre, em excursão, ou que o presidente, ao contrário do 11 de Setembro, onde prontamente subiu aos escombros, de capacete e megafone, prometendo vingança e assumindo o controlo da situação, não tenha agora posto umas galochas e um impermeável, para falar ao povo em cima de algum telhado flutuante. Pouco importam as considerações sobre o racismo, sobre a falta de meios, sobre o paradeiro dos helicópteros. Virá certamente o tempo para todos esses cálculos e facturações.
Por ora, há apenas o drama. Pessoas por encontrar, ainda enfiadas nalguma cave com o nariz de fora. Milhares de mortos por reconhecer, embrulhados em plástico e semeados pela rua. Incontáveis famílias a andar sem norte, reduzidas a grupos de esfomeados e vagabundos. Há cinco milhões de pessoas sem energia eléctrica. Gente isolada, sem acesso a terreno firme, que viu a casa ser devorada e o local de emprego arrastado pelo vagalhão. Há muito a fazer antes dos truques e dos tiros e das opiniões.
Quanto mais não seja há que lamentar, lamentar pesadamente e com todos os poros a desgraça de Nova Orleães. A cidade que nos deu o blues, o jazz, o rock 'n' roll. Onde convergiram os povos da América e se fez pela música essa ideia de sociedade mundial, muito imperfeita, mas que ainda vigora naqueles Estados. Vemos tudo isso afogar-se. Talvez para sempre.
Não é ainda o tempo de escrever cartas abertas, como a de Michael Moore, assacando responsabilidades e instrumentalizando a catástrofe com fins políticos. Bush é pequeno demais para o que aconteceu. E pouco importa se estava no rancho, a jogar às cartas, ou se foi à festa de tal financiador ou acrobata. Pouco importa que o air force 1 sobrevoaasse a área após o desastre, em excursão, ou que o presidente, ao contrário do 11 de Setembro, onde prontamente subiu aos escombros, de capacete e megafone, prometendo vingança e assumindo o controlo da situação, não tenha agora posto umas galochas e um impermeável, para falar ao povo em cima de algum telhado flutuante. Pouco importam as considerações sobre o racismo, sobre a falta de meios, sobre o paradeiro dos helicópteros. Virá certamente o tempo para todos esses cálculos e facturações.
Por ora, há apenas o drama. Pessoas por encontrar, ainda enfiadas nalguma cave com o nariz de fora. Milhares de mortos por reconhecer, embrulhados em plástico e semeados pela rua. Incontáveis famílias a andar sem norte, reduzidas a grupos de esfomeados e vagabundos. Há cinco milhões de pessoas sem energia eléctrica. Gente isolada, sem acesso a terreno firme, que viu a casa ser devorada e o local de emprego arrastado pelo vagalhão. Há muito a fazer antes dos truques e dos tiros e das opiniões.
Quanto mais não seja há que lamentar, lamentar pesadamente e com todos os poros a desgraça de Nova Orleães. A cidade que nos deu o blues, o jazz, o rock 'n' roll. Onde convergiram os povos da América e se fez pela música essa ideia de sociedade mundial, muito imperfeita, mas que ainda vigora naqueles Estados. Vemos tudo isso afogar-se. Talvez para sempre.
1 Comments:
É escusado dizer que se tivessemos ido passar férias a Marte, sem telemóvel ou portátil, bastaria ao chegar abrir o teu blog e ler este post, para perceber o que se passa em Nova Orleães (ou do que resta dela).
Mas se tivesse chegado de Marte, ficaria menos angústiada ao saber que países como a China ou Cuba, de imediato prestaram solidariedade...esta "réstia" de humanidade, está acima de critérios economicos - em paralelo com as forças da natureza.
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