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quarta-feira, novembro 30, 2005

Nun'Álvares

Com o provável encerramento do Nun'Álvares, no final do ano, desaparece o último cinema de bairro do Porto - e é muito bem feito. A cidade do primeiro realizador português (Aurélio Paz dos Reis), da primeira grande produtora nacional (Invicta Filmes) e do cineclube mais importante (nos anos em que os cineclubes foram importantes – anos 40 a 70), viu extinguirem-se todas as salas por falta de público. Guardo boas recordações do Foco, do Pedro Cem, dos Lumiére, do Charlot e até do Vale Formoso e do Batalha, mas o Nun'Álvares é o meu Cinema. Desde 1996, quando passou a ser programado pela Medeia, perdi quatro ou cinco filmes. Vi ali Rohmer, Kieslowski, Kiarostami, Cassavetes, Egoyan, Assayas, Techiné, Moretti ou o mais recente Herzog. Vi filmes quase impossíveis de ver noutra sala do Porto. E vi-os como gosto de ver filmes: rodeado de apreciadores de filmes. Que estão calados, não mastigam, não se mexem. Infelizmente, essa espécie morreu. Já não há legado cinéfilo na cidade. Já ninguém quer saber de filmes de autor ou de documentários. Querem encher-se de francesinhas e de pipocas a ver um filme escolhido à pressa, um qualquer, sff, para onde haja bilhetes. É uma romaria ao shopping, não é uma ida ao cinema. E a culpa não é dos que vão ao shopping, que sempre foram e sempre hão-de ir e ainda bem que o fazem. O lamentável são os “cultos” da cidade, que deixaram as salas fecharem, que trocaram o cinema pelas francesinhas. No outro espaço que resiste (mas que já não é um cinema como é o Nun’Álvares), o auditório do Campo Alegre, assisti há duas semanas à estreia do Quixote, do Orson Welles. Assisti eu e um amigo. Assistiu o casal em frente. Assistiu um indivíduo do meu lado esquerdo. E assistiu um fulano na primeira fila. Éramos seis pessoas mais o projeccionista. E foi um filme noticiado em todos jornais. Pergunto: vale a pena um homem incomodar-se a trazer filmes que ninguém vê? E repito: a culpa não é da garotagem que vai aos shoppings, não é do esvaziamento da cidade, não é das melhores salas com melhores condições – a culpa é inteiramente dos “cinéfilos”, que já morreram ou desistiram.

A decisão de encerramento ainda não é definitiva. Quem pode fazer alguma coisa porque acha que deve o momento é este. Comprar um bilhete já não é mau (a ver se o aguentamos até à estreia do Aurora, pelo menos.)

Há ideia de criar uma cinemateca em Gaia, aventada pelo Dorminsky. Talvez ainda hajam cinéfilos do lado de lá.

5 Comments:

Blogger FPM said...

Não estarás a exagerar? Desde sempre me lembro de ver filmes com apenas mais uma ou duas pessoas na sala. Tantos exemplos...
O Nun'Alvares, como todos os cinemas de cidade, tem dois problemas: os horários (por que não abre abre à hora de almoço, entre as 12h e as 15h?) e o estacionamento.
Depois, há factores externos, um deles, meu e de muito mais gente, chama-se "crianças"; outro, admito que haja pessoas para quem isso é significativo, "preço do bilhete"...
Quanto ao Quixote, sou absolutamente sincero: depois de ter visto (num Carlos Alberto com duas dezenas de pessoas, 18 das quais estudantes de cinema) o "QUe viva Mexico", tenho sempre muito medo dos filmes "acabados por outros".

10:15 da manhã  
Blogger Bernardo said...

Concordo, antes pelo contrário, em absoluto.

12:04 da tarde  
Blogger ris said...

Muito rapidamente: os preços dos bilhetes, que eu saiba, são iguais (ou quase iguais) no Nun'álvares e no AMC, por exemplo. à noite também não há problema de estacionamento naquela zona, assim como não havia no foco ou no Charlot (parque de estacionmento da Brasília). Não é verdade que o cinema de "culto" estivesse sempre às moscas: lembro-me da Casa das Artes, lembro-me das sessões duplas do Coliseu e lembro-me do próprio nun'alvares, há uns anos, com salas bastante compostas. Em todo o caso, eu refiro-me especificamente a um certo cinema: a distribuição comercial encontra sempre público, mas é só nos shoppings. Eu não digo que há falta de público em geral, digo que há falta de pessoas em salas que sobrevivem pela diferenciação, ou seja, que investem em cinema autoral, documentários ou cinematografias menos visíveis. São essas salas que progressivamente deixaram de ter público. Finalmente, em relação ao Quixote, não estava a discutir a qualidade do filme, mas a dar um exemplo de filme que deveria atrair um certo público e não atraiu. Só concordo contigo em relação aos horários. Abraço.

8:14 da tarde  
Blogger Bernardo said...

Concordo, antes pelo antónimo, em absoluto.

6:07 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Há sempre quem se ache melhor q os outros.. Eu acho-me! Tu não?!

1:11 da tarde  

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