O
site da Câmara do Porto continua a sua senda de blog de propaganda. Agora, a propósito da manifestação silenciosa que teve lugar no dia de estreia da peça
Jesus Cristo Superstar, de Filipe La Féria, aparece um lacaio a verberar sobre o director-adjunto do
Jornal de Notícias, David Pontes, pela sua participação no protesto. A coisa chega ao ponto de ser divulgado um
vídeo (aparentemente patrocinado pela Câmara) onde se mostra o jornalista ostentando um dos cartazes simbólicos que foram distribuídos – como se apanhado em "flagrante", em "pleno delito", "com as calças na mão".
Achei curiosos alguns dos comentários ao panfleto: vozes que não me surpreenderia que fossem de outros lacaios do município, chamam a atenção para a falta de equidade do jornal, demonstrada pela presença do director-adjunto na Praça D. João I e pela linha editorial seguida pelo diário. Fala-se em rigor, isenção, objectividade. Noutros países mais civilizados já há muito que é pacífica a liberdade de orientação dos diversos jornais. Nem o
Guardian, nem o
The Independent, nem o
Le Monde, o
La Repubblica, o
El Pais ou o
ABC têm qualquer pejo em expor claramente as suas posições políticas, as suas preferências e aversões, e de organizar a sua agenda em função delas. Ninguém é apanhado desprevenido. Ao comprar o jornal X o cidadão sabe o género de abordagem que encontra e pode perfeitamente preteri-lo pelo jornal Y, caso não se queira enervar. Aqui estamos longe disso.
E continua a acusar-se os jornalistas de "parcialidade" e "falta de rigor" quando não se aborda aquela notícia que procuramos, ou quando o tratamento dado não corresponde aos nossos desejos. Assumisse cada jornal uma tendência clara e teríamos um espaço público verdadeiramente democrárico e plural. Sem subterfúgios e "sugestões", com a bandeirinha certa para cada um.
Mas nem sequer é isso que importa neste episódio. O grave é condenar-se um cidadão (através de um vídeo de denúncia) pelo simples facto de expor a sua opinião. Como se, na qualidade de jornalista (ou director de jornal), tivesse deveres de recato e imparcialidade sobre matérias públicas na sua vida privada. E como se, nos editoriais (que não são notícias, alimárias!, são espaços de opinião), devesse manter a equidistância honrosa e ascética de quem não tem posição sobre o assunto. O grave é usar a plataforma de uma instituição pública para campanhas de perseguição e denúncia, com uma linguagem daninha, reveladora da exiguidade mental desses “
spin doctors”. Como se o
site da Câmara do Porto fosse um edital onde se afixa o nome dos criminosos e degenerados. À custa do nosso dinheiro.
Sobre o ambiente malsão desta cidade (que cada vez tem menos gente para a cheirar), leia-se o editorial de hoje do Público (muito pouco rigoroso) e este post do Kontratempos (tremendamente parcial).Etiquetas: Jornalismo, Liberdade de expressão, Porto